Mauricio Pássaro
18 de outubro
CELULARES II
Tá ligado?
O tempo passou, o cara não ligou mais pra ela. Coisa de desocupado. Vai ver, encontrou o que fazer e não amola mais. Entretanto, numa tarde de chuva, mesmo com os sinais de celulares pegando mal, o aparelho da moça disparou, o amarelo novamente, resolveu tocar, dentro do coletivo: refrão de um clássico de Michel Teló. Ela aguardava telefonema de amiga.
...
- Alô! Ledinha!
Não, não era a Ledinha. Voz grave, de homem. Número desconhecido. Era ele, o mal educado, depois de algumas semanas.
- Olá. Quanto tempo! Quer dizer, estivemos ontem, no mesmo ônibus...
- Escute aqui, você tem que parar com isso. Vou dar queixa na polícia!
- Calma. Só liguei pra saber como está o seu cãozinho, o Tutuia. Ele melhorou?
- Tutuia é o nome meu namorado!
O interlocutor desconhecido fazia confusão. Do jeito mimado que ela falava, naquele outro dia ao celular, parecia que estava em diálogo com o seu cachorrinho.
- Você é possessiva. A gente conhece uma mulher possessiva, pela voz.
- Ora, essa. Eu? Possessiva? Não tenho que lhe dar satisfações! Além do mais, o namorado é meu e...
- Tá vendo... Ele é “seu”. Já que você nos participou a conversa – alugando os ouvidos de quarenta e dois passageiros, mais o motorista e o trocador, e mais tantos desencarnados, pois eu sou espírita – acho que posso também dar uma sugestão. Deixe o Tutuia jogar bola com os amigos, pela manhã, nos fins de semana. É coisa de homem. Depois ele volta. Cansado e perfumado de cachaça, mas volta. Mas, se você encher muito o saco dele, ele vai embora.
Ela não estava acreditando em tamanha petulância. Não se conteve e arremessou o celular na bolsa, naquela região onde cabe o infinito, uma espécie de buraco negro interdimensional. Uma vez o cãozinho se escondeu na bolsa e só anunciou presença quando ela se sentou à mesa do restaurante, na hora do almoço.
Maurício Pássaro
www.acolunadoservidor.comVer mais
Tá ligado?
O tempo passou, o cara não ligou mais pra ela. Coisa de desocupado. Vai ver, encontrou o que fazer e não amola mais. Entretanto, numa tarde de chuva, mesmo com os sinais de celulares pegando mal, o aparelho da moça disparou, o amarelo novamente, resolveu tocar, dentro do coletivo: refrão de um clássico de Michel Teló. Ela aguardava telefonema de amiga.
...
- Alô! Ledinha!
Não, não era a Ledinha. Voz grave, de homem. Número desconhecido. Era ele, o mal educado, depois de algumas semanas.
- Olá. Quanto tempo! Quer dizer, estivemos ontem, no mesmo ônibus...
- Escute aqui, você tem que parar com isso. Vou dar queixa na polícia!
- Calma. Só liguei pra saber como está o seu cãozinho, o Tutuia. Ele melhorou?
- Tutuia é o nome meu namorado!
O interlocutor desconhecido fazia confusão. Do jeito mimado que ela falava, naquele outro dia ao celular, parecia que estava em diálogo com o seu cachorrinho.
- Você é possessiva. A gente conhece uma mulher possessiva, pela voz.
- Ora, essa. Eu? Possessiva? Não tenho que lhe dar satisfações! Além do mais, o namorado é meu e...
- Tá vendo... Ele é “seu”. Já que você nos participou a conversa – alugando os ouvidos de quarenta e dois passageiros, mais o motorista e o trocador, e mais tantos desencarnados, pois eu sou espírita – acho que posso também dar uma sugestão. Deixe o Tutuia jogar bola com os amigos, pela manhã, nos fins de semana. É coisa de homem. Depois ele volta. Cansado e perfumado de cachaça, mas volta. Mas, se você encher muito o saco dele, ele vai embora.
Ela não estava acreditando em tamanha petulância. Não se conteve e arremessou o celular na bolsa, naquela região onde cabe o infinito, uma espécie de buraco negro interdimensional. Uma vez o cãozinho se escondeu na bolsa e só anunciou presença quando ela se sentou à mesa do restaurante, na hora do almoço.
Maurício Pássaro
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