FOGUEIRA
DE SÃO JOÃO
Edmílson Martins
Junho/2019
Todo ano, no dia 23 de junho, véspera
do dia de São João, eu e alguns dos meus irmãos mais velhos éramos dispensados
do trabalho da roça, para catarmos madeira para a fogueira.
Íamos
pelas capoeiras à procura de troncos secos de árvores. Quando não encontrávamos
troncos suficientes, completávamos com madeira verde. Catávamos também talos
secos para ajudar no acendimento da fogueira.
Quando
voltávamos pra casa, com vassouras do mato, ajudávamos nossas irmãs na
varredura do vasto terreiro, onde à noite se realizaria a tão esperada festa
junina. E logo após o preparo do terreiro, começava a montagem da grande fogueira,
que, geralmente, tinha uns três metros de altura.
Fazia
parte das alegrias da festa, as roupas novas que nossa mãe fazia,
principalmente, para as crianças e adolescentes. Eu e meus irmãos ficávamos
todos muito felizes com a roupa que a minha mãe fazia e com as sandálias feitas
pelo meu primo Antônio Domingos.
Durante
todo o dia, tudo se arrumava para os festejos, que começavam por volta das 19
horas. Além do preparo do terreiro e da
montagem da fogueira, as comidas típicas: Bolo de puba, pamonha, canjica de milho
verde. E mais tarde, a batata doce e espigas de milho verde, assados nas brasas
da fogueira.
A
fogueira já estava queimando, quando as pessoas começavam a chegar e se
cumprimentavam, iniciando alegres e longas conversas. As crianças brincavam de roda
e soltavam estalinhos, os adultos soltavam balão e explodiam fogos. E começavam
os comes-e-bebes.
Mais
tarde, em volta da fogueira, crianças e jovens, perante São João, se
comprometiam. E ali, muitos namoros começavam, namoros que muitas vezes acabavam
em casamentos. E seguiam os rituais.
As crianças: “São Pedro dormiu, São João
acordou, você vai ser meu padrinho (ou madrinha) que São João mandou”.
Os jovens: “São Pedro dormiu, São
João acordou, você vai ser meu compadre (ou comadre) que São João mandou”.
Assim,
a festa rolava até de madrugada, ou ao amanhecer do dia. Às vezes, tinha
sanfoneiros, zabumbeiros e repentistas, que meu pai convidava, para alegrar
mais ainda os festejos.
Tudo ao som da música sentimental do
Luiz Gonzaga, música que mexia com o coração do povo do sertão: ”Crianças
brincando de roda/Velhos soltando balão/Moços em volta à fogueira/brincando com
o coração”. Ou, “A fogueira tá queimando/Em homenagem a São João...”. Ou ainda,
“Olha pro céu, meu amor/veja como ele está lindo”... Tudo era muito bonito e
muito saboroso. Lembranças que nunca me saem da memória.
Como
se sabe, os festejos juninos e joaninos acontecem em homenagem a São João
Batista, que no deserto pregava a vinda do libertador, que implantaria na Terra
o Reino de Deus. “Apareceu um homem
enviado por Deus, que
se chamava João. Ele veio como testemunha, para dar testemunho da luz, a fim de
que todos acreditassem por meio dele” (Jo 1,6-7).
A fogueira é o
símbolo da luz que o sertanejo precisa para iluminar a longa noite do vasto e
seco sertão; da esperança do povo em um mundo melhor, com paz, justiça, amor e
alegria. Representa o desejo de participar na construção de um mundo novo, com
ousadia e ardor. Daí, os versos da música “São João, São João/Acende a fogueira
do meu coração”.
Tempos
bons aqueles da minha infância no sertão, quando havia pobreza, mas as
diferenças eram superadas pela convivência e desejo de um mundo solidário. Reuniam-se
na festa joanina pessoas das mais diversas condições sociais de vida. Ficavam
ali, todos juntos, curtindo a mesma alegria. Não havia crianças, jovens ou
idosos ricos, nem pobres. Ali, eram todos iguais, vivendo fraternalmente a
mesma alegria.
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