quinta-feira, 25 de julho de 2019

AS MANGUEIRAS MAL ASSOMBRADAS 2




AS MANGUEIRAS MAL ASSOMBRADAS  2

                                  Edmílson Martins
                                 Maio/2019

No texto anterior sobre as mangueiras mal assombradas, relatei o drama do meu irmão Raimundo, quando saía, às dez horas da noite, da casa da namorada, depois de beber vários copos d´água, e tinha que passar embaixo das tais mangueiras, na mais completa escuridão.
Enviei o texto pra ele, pelo whatsapp. Imediatamente, ele me respondeu dizendo o seguinte: “Gostei muito do texto e da lembrança. Foi aquilo mesmo. Mas você não relatou a parte do cachorro”.
- Que parte do cachorro? – perguntei.
Ele esclareceu:
- Quando saí da casa da namorada, morrendo de medo e com a barriga cheia de água, andei em direção às mangueiras, com passos lentos e trôpegos. Penetrando na escuridão, ouvi alguma coisa se mexer à minha frente, fazendo barulho nas folhas do chão. Pensei logo: deve ser a alma, mas não vou voltar. Saquei da faca que levava na cintura e, mesmo com as pernas bambas, continuei, pensando: “seja o que for, vou enfrentar”.
- E depois, o que aconteceu? – perguntei.
Ele me respondeu, com alguma emoção, como se estivesse vivendo aquele momento:
- O barulho continuava à frente e eu andava, resoluto, com a faca na mão. Depois de alguns minutos, que pareciam horas, cheguei ao outro lado, onde tinha uma cancela. Percebi, então, que a “alma” era um cachorro que me acompanhava, passando à minha frente, sem que eu percebesse.
Depois do sufoco e já aliviado, disse-me ele que desabafou em cima do cão:
- Ah! Cachorro desgraçado! fazer-me passar tanto aperto e apreensão!
O medo, a apreensão e a emoção não o deixaram compreender que o cachorro queria somente ser seu companheiro e queria lhe dá força e coragem.

Esses são detalhes de uma das muitas estórias que ouvi e que marcaram a vida de gerações, obrigadas a andar, muitas vezes, na escuridão das noites sem lua, enfrentando, mesmo com medo, o desafio de encontrar “almas do outro mundo”.
O medo e a valentia do meu irmão Raimundo, como de muitos outros, confirmam a frase do escritor Euclides da Cunha, autor do livro “Os sertões”, quando afirmou: “O sertanejo é, antes de tudo, um forte”.
Tem razão o poeta, quando fala da valentia do sertanejo, mas esqueceu um detalhe:
“O sertanejo é forte, não tem medo de nada, a não ser de assombração”.

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