domingo, 19 de março de 2023

A IGREJA E AS FESTAS POPULARES

 


 

A IGREJA E AS FESTAS POPULARES

                                        Edmílson Martins de Oliveira

                                         Março/2023

 

Quando criança, eu sempre ia, em romaria, à cidade, para as festas do Natal e da padroeira, promovidas pela igreja. A caminhada era alegre, saborosa e bonita. A gente andava umas duas horas até chegar à cidade, conversando, brincando, cantando, sentindo cheiro das árvores e ouvindo o canto dos passarinhos.

 

Na cidade, a gente se hospedava em casa de amigos, ou parentes, geralmente, muito hospitaleiros e solidários. Para não abusar dos amigos, levava-se mantimentos para as refeições, redes e lençóis para dormir. As casas dos amigos, ou parentes ficavam repletas de visitantes. O ambiente era fraterno.

 

A cidade, engalanada e dinamizada, com pessoas diversas, que chegavam dos mais distintos rincões, transformava-se e tornava-se palco de grande  animação. À noite, as ruas iluminadas, repletas de barracas e pontos de venda, pontuavam a festa. Vendia-se de tudo: comidas diversas, doces, frutas, bijuterias, artesanatos. E mais: ao som de músicas populares, transmitidas por um serviço de alto-falantes.

 

A igreja, que era o motivo de toda aquela movimentação, ficava repleta de gente, participando das celebrações. Eram cantos, orações e palestras, que culminavam com a missa do galo , à meia noite, na festa do Natal. A festa da padroeira, Nossa Senhora da Penha, da cidade de Milagres, reunia também milhares de devotos.

 

O padre incentivava o povo a fazer confissões. As filas eram enormes diante do confessionário. O pároco chamava-se Joaquim Alves, conhecido e temido por ser rigoroso nas suas pregações e orientações pastorais. As pessoas tinham medo de fazer confissão com ele. Mas quando não havia outro padre, as pessoas tinham que confessar com ele mesmo.

 

Eu tinha entre sete e oito anos e queria, por recomendação da minha mãe, comungar. Mas precisava, antes, confessar. E era  com o padre Joaquim Alves.

Eu falava com meus botões: Meu Deus! o que vou dizer a ele? Pecado, eu nem sabia direito o que era. Mas entrei na fila e chegou minha vez.

- Conte seus pecados – bradou o padre.

Suei frio, fiquei calado, por um instante. Ele repetiu:

- Conte seus pecados.

Tomei coragem e comecei a falar qualquer coisa. Assim:

- Ah! Eu, às vezes, brigo com meus irmãos, tenho preguiça, desobedeço a meus pais...

- Tá bom, reze o Ato de Contrição, o Pai Nosso e três Ave – Marias.

Vendo que eu era criança, o padre não foi exigente, agindo com mansidão no contato comigo.

 

Estava de joelhos, nem rezei o Ato de Contrição direito, levantei meio titubeante e fui me ajoelhar diante do altar de Nossa Senhora para cumprir a penitência determinada pelo padre. Diferente de Renato Teixeira, da música Romaria, mostrei meu olhar e rezei, porque já sabia rezar.

 

Foi minha primeira confissão e primeira comunhão, sem ter passado pela catequese oficial. Mas tive catequese. Todos os dias, minha mãe reunia, depois do jantar, eu e meus irmãos para ensinar as orações: Pai Nosso, Ave-Maria, Ato de Contrição, Salve Rainha, com a reza do Terço. Depois, contava histórias, que eram o incentivo para as orações.

 

Pronto. Depois da confissão, da participação na missa e da comunhão, com os “pecados” perdoados, minha alma estava aliviada. Podia participar, com toda serenidade, dos festejos que rolavam nas ruas da cidade, com muita música, alegria, comidas e bebidas. A festa ia até de manhã, com o povo transbordando de alegria.

 

A volta para casa, após o contato com a padroeira, e com seu filho Jesus, era alegre, ao contrário da volta dos discípulos de Emaús, que caminhavam tristes por causa da crucificação de Jesus, que os acompanhavam, sem que eles percebessem. Só se alegraram depois que o Mestre se revelou. A gente voltava alegre porque tinha se divertido na festa e se sentia com Jesus e Maria no coração, apesar da dureza e rabugice do pároco.

 

Na estrada, todos conversavam alegres e satisfeitos sobre a festa, sobre o padre ranzinza e as cerimônias na igreja, cantando, observando as paisagens, o cantar dos passarinhos e  o frescor dos matos verdes. As emoções, o calor humano das festividades, as cerimônias, as pregações do padre, a hospitalidade dos amigos e parentes perduravam no coração da gente.

 

 

 

 

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