UM DIA, NÃO VOLTEI PARA CASA
Edmílson Martins de Oliveira
Março/2023
Corria o mês de abril de 1972. Ditadura pesada. Aterrorizante. O ditador de plantão era o general Emílio Garrastazu Médici, de triste memória. Homem frio, insensível, cruel. Implantou em nosso país a perseguição aos que se opunham ao regime perverso, com prisões, torturas, mortes e desaparecimentos.
Eu era presidente do Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro. Defendíamos os direitos dos trabalhadores bancários, de forma legal, usando algumas prerrogativas que ainda eram mantidas pelos tribunais trabalhistas. Mas os direitos supostamente mantidos e as decisões dos tribunais eram apenas para fazer de conta. O que valia mesmo eram os objetivos da ditadura, com o favorecimento do grande capital, mesmo prejudicando os trabalhadores.
Alegavam que defender os direitos dos trabalhadores, mesmo direitos legais, era ser contrário ao governo estabelecido pela força das armas. Fazer oposição não era permitido, era crime. E para manter a aparência de liberdade dos poderes judiciais, tachavam de comunista todo e qualquer movimento que contrariasse o poder ilegalmente constituído.
Diante de tudo isso, o clima social e político era sombrio. Como disse o Chico Buarque, na música “Apesar de Você”: “Hoje você é quem manda/Falou, tá falado/Não tem discussão, não/A minha gente hoje anda falando de lado/E olhando pro chão,...” Era assim, escuridão geral. O sol não aparecia. Sempre nuvens carregadas, ameaçando chuvas a qualquer momento. E chuvas pesadas, temporais...
As ameaças eram frequentes. A implantação do regime violento trouxe consigo o terror, o medo e o recolhimento das pessoas. Eu saía de casa para o sindicato e não sabia se voltaria, tamanhas eram as incertezas. Até que um dia – triste dia – não voltei. Era o dia 17 de abril de 1972 de triste memória. Nesse dia, às 19 horas, fui levado pela Polícia Federal, com a alegação de que eu estaria contrariando a política econômica do governo, ilegalmente constituído. A família, os companheiros, os amigos não sabiam onde eu estava. Foram dez dias de sumiço e quarenta e seis dias atrás das grades. Que sufoco!
Aquele dia durou treze anos, supostamente até 1985, quando a ditadura supostamente acabou. Aquele dia, na verdade, não acabou. Vivemos ainda as consequências das violências perpetradas durante vinte e um anos. É pouco dizer que o golpe civil/militar durou vinte e um anos. Terminou a ditadura militar, mas continuou a ditadura civil, imposta pelo brutal poder econômico nacional e internacional, que continua espalhando terror, miséria, fome e morte.
Segundo o IBGE, o Brasil tem mais de 13 milhões de pessoas na extrema pobreza, aquelas que, de acordo com o Banco Mundial, vivem com até R$ 151 por mês. E quase 52 milhões na pobreza - com renda de até R$ 436 por mês. Tudo por causa da ditadura econômica, que mantém a maior parte das riquezas nas mãos de poucos, em detrimento da maioria, que fica com quase nada. É isso que se chama ditadura, mantida durante vinte e um anos pelo poder militar e até hoje pelo poder econômico.
A luta que se travava antes do golpe militar de 1964, pela construção da sociedade democrática, com justas condições de vida para todos; a luta que se travava durante os vinte e um anos de ditadura pelas liberdades democráticas tem que continuar contra o perverso poder do capital, contra as desigualdades sociais e pelo estabelecimento de uma sociedade justa, sem miséria, sem fome, sem violência, em que todas as pessoas tenham direito à paz e à vida plena. DITADURA NUNCA MAIS!
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