MÃE: SER SAGRADO
Edmílson Martins
Maio/2022
Na cultura popular, mãe sempre foi um ente sagrado. “Que ninguém toque na minha mãe”. É essa a advertência. E são muitos os exemplos de reação, quando alguém trata a mãe do outro com desdém, ou com palavras impublicáveis. Parafraseando Chico Buarque: se alguém desafia e bota a mãe no meio, é pernada a três por quatro, sem nem se despentear.
Lembro-me de que no ambiente de trabalho, quando alguém chamava outro de filho dessa ou daquela outra, mesmo de brincadeira, havia sempre uma advertência: “Mãe não, mãe é sagrado”. E logo paravam as brincadeiras.
Quando eu era criança, assisti a muitas brigas, por causa da mãe. Se um garoto xingava outro, por exemplo, de filho da puta, o pau quebrava. A briga começava e os dois rolavam pelo chão. E ainda havia os que provocavam, fazendo dois riscos no chão: “Aqui é sua mãe e aqui é a mãe dele”. Se um pisasse no risco que representava a mãe do outro, era briga com certeza.
Na cidade de Crato- Ceará, onde morei, certa vez houve um julgamento de um homem que matara outro. O advogado de defesa, muito esperto, assim falou:
- Senhor juiz, este homem merece complacência, porque foi induzido a matar o outro. A vítima o provocou muito, ofendendo a sua moral e da sua família. Chamou o acusado de filho duma égua, e mais senhor juiz e senhores jurados, chamou-o de filho da puta.
Um dia, Rinaldo, meu filho, com seis anos, chegou da rua aborrecido. Sentou-se, demonstrando tristeza. Aí, a Maria José perguntou:
- Meu filho, por que você está tristinho? O que houve?
Ele respondeu prontamente:
- O meu colega xingou você, me chamando de filho da puta.
- Você sabe o que é isso, meu filho – indagou a Maria José.
Ele respondeu, revelando sua intuição:
- Não, mas sei que é uma coisa feia. Ele ofendeu você. Não gostei.
Maria José, compreendendo a indignação do filho, tentou explicar o que aquilo significava, concluindo:
- Deixe pra lá, você sabe que eu não sou isso.
Esclarecido, ele voltou ao normal e foi brincar com os amigos.
Em 1972, quando fui preso pela ditadura, por causa de minhas atividades sindicais e políticas, o delegado que me interrogou me chamou de filho da puta. Naquele momento, lembrei-me do meu tempo de criança, o sangue subiu-me à cabeça e tive que contar até dez para não avançar sobre o delegado.
É muito forte essa ideia do sagrado em torno da figura da mãe. É uma tradição e vem desde os tempos antigos. Mãe é uma figura tão forte, que se tornou musa para os poetas. “Ela é a palavra mais linda/ Que um dia o poeta escreveu”. (Toquinho). “Mãe, na sua graça, é eternidade. “Fosse eu Rei do Mundo, baixava uma lei: Mãe não morre nunca” (Carlos Drummond de Andrade).
Enfim, mãe é um ser misterioso, amado, considerado, cantado em verso e prosa, eternizado pelos poetas: “Mãe não tem limite, é tempo sem hora, luz que não se apaga”. (Drummond). “Mãe, renovadora e reveladora do mundo/A humanidade se renova no teu ventre”. (Cora Coralina).
Mãe, criada por Deus para ser ternura, brandura, tolerância, realmente, “não tem limite, é eterna, é luz que não se apaga”. Pela sua missão criadora, coragem e disposição de enfrentar dificuldades no processo da criação, merece ser amada e homenageada, com todo o carinho e respeito, sempre, todos os dias, meses e anos.
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