segunda-feira, 26 de abril de 2021

A LAVADEIRA

 

 

 

                                        A LAVADEIRA

 

                                              Edmílson Martins

                                               Abril 2021

 

No meu tempo de criança, no sertão do Ceará, na roça, eu e outras crianças saíamos, com baladeiras, para caçar passarinhos. Caçávamos rolinhas, juritis codornizes, inhambus e outros pássaros.

 Só um passarinho não caçávamos. Era uma avezinha branca, com asas pretas e uma faixa negra que lhe atravessava os olhos. Vivia na beira de açudes e se aproximava muito das pessoas. Chamava-se Lavadeira. De vez em quando, bebericava a água molhava e sacudia as asas. Dizia-se que “lavava as roupas, do Nosso Senhor”.

 Essa informação lendária ficou bem arraigada na cultura popular e ficou presente na memória de várias gerações. Daí, a tradicional musiquinha: “Lava, lava, Lavadeira/Lava, lava, lavadeira/Quem de ensinou a lavar/Foi, foi, foi o peixinho do mar”/Esses meninos vadios/Que andam de baladeira/Matam todos passarinhos/Só não matam Lavadeira”.

 A gente saía em caçada aos passarinhos, não só por divertimento, mas também em busca de complemento alimentar. Mas, por falta de consciência ecológica e de cuidados com a natureza, matávamos alguns pássaros que não serviam para a alimentação.

 Porém, naquele pássaro sagrado, que, sem medo, se aproximava da gente, ninguém tocava. Cultivava-se a ideia de que aquela ave simpática e alegre, colaborava com Nossa Senhora, ajudando-a a lavar as roupas, tingidas de sangue, do seu filho e nosso Senhor Jesus Cristo.

 Durante anos, depois que vim morar na cidade, não via aquela avezinha. Um dia, ela apareceu no quintal lá de casa, em Água Santa- Rio de Janeiro, cantando com insistência e se aproximando da gente. Tudo indicava que estava pedindo água.

 A Maria José, enquanto cuidava do jardim, conversava com ela:

- Ah! Você está querendo água, né? Precisa lavar roupa, certo? Tudo bem. E logo abria a torneira e deixava a água empoçar no quintal. Ela depressa se aproximava da água, bebericava, molhava as asas e as sacudia, demonstrando alegria e agradecimento.

Hoje, aos oitenta e dois anos, com consciência ecológica e sabedor dos cuidados que todos devem ter com a natureza, Já não mataria rolinhas, juritis, codornizes, inhambus, ou qualquer outro pássaro. Todos são sagrados, frágeis e delicados. Aves do Céu. São seres que alegram e encantam a natureza, trazendo mais vida, tornando as pessoas mais sensíveis e humanas. Merecem ser tratados com carinho, respeito e atenção.

 

 

 

 

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