quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021

CIDADE MARAVILHOSA

 









CIDADE MARAVILHOSA

                                   (Experiências de um retirante)

                                       

                                                Edmílson Martins

                                                Fevereiro/2021

 

No dia 20 de março de 1960, às 20 horas, eu chegava ao Aeroporto Santos Dumont. Vinha da cidade de Crato, Ceará, num avião, que voando a cinco mil metros de altura, demorou cerca de dez horas para chegar ao Rio de Janeiro.

 

Por telegrama, eu avisara ao meu irmão Agostinho que chegaria àquela hora. Ele não recebera o telegrama. No aeroporto, procurei-o e não o encontrei. Fiquei meio atrapalhado. Um companheiro de viagem, acho que se chamava Luiz Gonzaga de Melo, conterrâneo e jornalista, que trabalhava na Agência Nacional, vendo a minha aflição, generosamente, procurou no catálogo de telefones e encontrou o telefone de um vizinho do meu irmão, conseguindo avisá-lo de que eu o esperava no aeroporto. Guardo na memória, com gratidão, aquele companheiro. Nunca mais o vi.

 

Eu tinha 21 anos, quando cheguei ao Rio de Janeiro. Vim para ficar, em busca de melhores condições de vida. Naquele momento, finalzinho do governo Juscelino Kubtschek, com a construção de Brasília, vivia-se um clima de euforia, romantismo e esperança. Influenciado por esse clima, saí do Nordeste, em busca de nova vida.

 

Indo de bonde para casa do Agostinho, com ele e sua esposa, comecei a observar, no trajeto, o cenário da cidade maravilhosa, toda iluminada, com trânsito intenso, prédios altos, letreiros luminosos, etc. Tudo para mim era interessante, por ser o meu primeiro contato com uma cidade grande.

 

Ao contemplar esse cenário, pensava nas informações contraditórias sobre a cidade maravilhosa. Ao lado das belezas naturais e culturais, havia informações negativas: violência, libertinagem, malandragem e ação de vigaristas. Conhecia isso através do cinema, programas de rádios e revistas.

 

Quando comecei a procurar emprego, encarei a cidade com deslumbramento e, ao mesmo tempo, desconfiado, com um certo medo. Eu estava muito influenciado pelas informações negativas. Até mesmo a fisionomia das pessoas me assustava. Lembro-me de um colega do Banco de Crédito Real, muito carrancudo, que me assustava. Com o tempo e convivência descobri que era uma pessoa maravilhosa.

 

A vontade de ver os aspectos positivos e a certeza de que eles são mais fortes do que os negativos venceu o medo e a desconfiança. Tudo isso desaparece quando a gente acredita no lado bom da vida e nos valores positivos, próprios do ser humano. E fui descobrindo que na cidade maravilhosa e no povo havia mais valores positivos do que negativos.

 

Assim, tentando vencer as barreiras da desconfiança e do medo, eu resolvi logo participar de atividades sociais, encontrando acolhimento nos Movimentos da Igreja Católica e depois no Movimento Sindical Bancário. E quis conhecer de perto os lugares e cenários que marcaram época, com acontecimentos importantes registrados na História, nas obras literárias e na música popular. Já entendia que o conhecimento da História e da cultura do nosso povo nos dá força e coragem.

 

Comecei pela Praça da República, cenário que marcou o final da monarquia e o início do sistema republicano. Pelos livros de História, eu conhecia a proclamação da República, feita pelo Marechal Deodoro da Fonseca; pelo romance “Esaú e Jacó” de Machado de Assis, eu conhecia a Praça da República e a movimentação popular em torno dela, em função da proclamação do sistema republicano.

 

Andando pela cidade, encontrei a Rua do Ouvidor, Passeio Público, Outeiro da Glória, Praia do Flamengo, etc., cenários de famosos romances de Machado de Assis, o mais carioca dos escritores brasileiros. Quincas Borba, Brás Cubas, Dom Casmurro e outros personagens de Machado estiveram nesses ambientes.

 

Nas minhas buscas, quis logo conhecer Copacabana, da canção de Tom Jobim: “Copacabana princesinha do mar”, e da canção interpretada por Nelson Gonçalves: “É bonita essa Copacabana, é bonita, é bonita demais”.  E a Lapa da canção de Wilson Batista, interpretada por Nelson Gonçalves “História da Lapa”: “Lapa, dos capoeiras,/Miguelzinho camisa preta,/Meia Noite e Edgar”. E da música de Noel Rosa, interpretada por Orlando Silva “Dama de Cabaré”: “Foi num cabaré na Lapa/ Que eu conheci você”. Sucessos nacionais, que despertavam curiosidade e vontade conhecer esses lugares.

 

Tudo isso e mais o Pão de Açúcar, o Corcovado, a Floresta da Tijuca, a Quinta da Boa Vista, as outras praias e a população, composta por diferentes raças e culturas, formando um povo fagueiro e hospitaleiro, justificavam, para o Rio de Janeiro, o nome “Cidade Maravilhosa”. Realmente “Cheia de encantos mil”; “Berço do samba e das lindas canções”; “Terra que a todos seduz”, como destaca a canção, que virou hino oficial da cidade.

 

Fiquei seduzido e aqui estou há 61 anos, com ampla participação social e política, com esposa fluminense, (de Barra Mansa), quatro filhos, quatro netos, noras e genro cariocas. Mas devo dizer que a cidade maravilhosa me seduziu, porém, nunca esqueci minha terra natal, que também é maravilhosa.

 

Hoje, esta cidade de São Sebastião e do Cristo Redentor, cheia de riquezas naturais, tão carinhosa com seus filhos, tão acolhedora, infelizmente, anda muito maltratada, depredada pela ação de gente gananciosa e insensível e pela má administração de políticos maus, incompetentes e irresponsáveis. Mas, apesar de tudo, continua sendo “Cidade Maravilhosa/ coração do meu Brasil”.

 

 

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