domingo, 23 de janeiro de 2022

JOSÉ DE SOUZA E DONA QUINÔ

 

 

 

JOSÉ DE SOUZA E DONA QUINÔ

                                Edmílson Martins

                                 Janeiro/2022

 

 Eles marcaram minha infância. E representam aquela gente simples, humilde, trabalhadora, persistente e resistente. São parte daqueles e daquelas que, no anonimato, verdadeiramente contribuem para a construção do nosso país. Este texto é uma homenagem a todos esses heróis e heroínas anônimos do nosso  Brasil.

 Tinham quatro filhos e moravam no sítio do meu pai, com quem trabalhavam fraternalmente. Ainda me lembro deles. José de Souza, um homem negro, corpulento, de temperamento afável, sereno, fraterno e sempre disposto para o trabalho. Dona Quinô, também negra, meiga, de trato carinhoso, muito dedicada ao trabalho e criação dos filhos. Eram analfabetos, mas cheios de conhecimentos e sabedoria. Estudantes permanentes da Escola da Vida.

 Eu e seus filhos brincávamos juntos, como irmãos. Estavam sempre lá em casa e eu sempre na casa deles. Entre nós não havia diferença de cor, nem de classe social. José de Souza e dona Quinô tinham um alto grau de amizade com meus pais, que os respeitavam e tinham por eles grande consideração.

 Um dia, ainda me lembro, meu pai e minha mãe estavam discutindo por causa de um probleminha, daqueles comuns a todo casal. Os dois ficaram amuados, um num canto e o outro noutro canto. José de Souza, que presenciava tudo, bem conciliador, aproximou-se da minha mãe e, muito carinhoso, falou:

- Tu gosta dele, né cumadi!

Minha mãe respondeu:

-Gosto, mas ele não pode me tratar assim.

Então, o José de Souza, bem manso, aproximou-se de meu pai e disse:

- Tu briga com ela, mas bem gosta dela, né cumpadi!

Meu pai, aparentemente aborrecido, ficou calado, assentindo que gostava dela.

Dentro de poucos minutos, os três estavam conversando sobre as roças, a família, etc., com minha mãe servindo cafezinho. Parece que a briga teria sido por causa do cafezinho, que minha mãe não queria fazer, porque estava ocupada, costurando.

 José de Souza e dona Quinô viveram a vida toda no sertão. Apesar da pobreza, eram alegres e felizes. Lutavam com garra e perseverança pelo pão de cada dia. Nunca os vi tristes, ou lamentando por causa das dificuldades. Ele partiu deste planeta com, mais ou menos, 100 anos de idade e ela com pouco menos.

 A última vez que os vi foi em 1985, quando lá estive, com todos os meus irmãos, para celebrar o aniversário de 80 anos da minha mãe. Estavam eles lá, já idosos, com a mesma alegria e serenidade de anos atrás. Idosos, mas cheios de jovialidade, sempre teimosos na esperança.

 

 

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