O GRÊMIO ESCOLAR
Edmílson
Martins
Janeiro de 2020
Era o ano de 1951. Eu tinha doze anos e alguns meses
de idade, quando entrei para o Grupo Escolar de Crato-Ce, no Segundo Ano
Primário.
No ano anterior, 1950, eu saíra da roça, no sítio
Ipueira, para estudar em Crato, levado pelo meu irmão Agostinho, que já se
encontrava na cidade há alguns anos.
Após estudar durante um ano no Pré-primário, num
cursinho dirigido por Dona Antônia, em sua residência. Ela preparava crianças
entre dez e doze anos, que nunca tinham estudado em uma escola.
Foi minha primeira professora. Com ela não tive
dificuldades, porque já tinha sido alfabetizado pelo meu irmão José (de saudosa
memória). Ainda me lembro dela. Era uma senhora mulata, de olhos grandes e
atenciosos, lábios grossos, cabelos encaracolados. Muito simpática e
comunicativa. Excelente educadora. Ainda me lembro das estórias que ela
contava, desenhando os personagens no quadro negro.
No final do curso, ela me encaminhou para o Grupo
Escolar, sugerindo a minha matrícula no Segundo Ano Primário, sustentando que
eu estaria preparado para ingressar no Segundo Ano.
Quando cheguei à sala de aula, uma professorinha deu-me
as boas vindas e encaminhando-me ao quadro negro, passou alguns exercícios de
matemática e língua Portuguesa. Acertei tudo que ela propôs, com facilidade.
Então, ela me encaminhou para o Segundo Ano forte. Havia o Segundo Ano fraco e
o Segundo Ano forte.
Eu era o mais velho da turma. Tinha entre doze e treze
anos e a meninada tinha entre nove e dez anos. Quase todos filhos da classe
média cratense, que tinham estudos regulares, desde o Pé- Primário.
Talvez, por causa da idade, com mais experiência, ou pela
grande vontade de estudar, eu me destacava na turma. A nota máxima, naquele
tempo era doze. Eu sempre conseguia a máxima, em todas as matérias.
A professora chamava-se dona Sila. Lembro-me da figura
e do jeito dela: baixinha, gordinha, muito dinâmica, comunicativa e simpática.
Tinha o respeito e admiração da criançada.
Um dia, no final do primeiro semestre, ela reuniu toda
a turma, fora da sala de aula, no pátio da escola e propôs a criação de um
Grêmio. Primeiro, explicou o que era um grêmio, suas funções, seus objetivos.
Dona Sila era uma verdadeira educadora. Sentia o dever
de transmitir à criançada uma educação verdadeira, completa, com iniciativas
que levassem os alunos a participar da construção de sua cidadania.
Naquele tempo, havia movimentos estudantis atuantes,
com muitos grêmios escolares e outros grupos organizados. Em Crato existia a
União dos Estudantes de Crato (UEC), muito atuante na região, em defesa da
organização dos estudantes.
Pois bem, dona Sila propôs à turma a criação do grêmio
e me indicou para presidente. Talvez, porque eu era o mais velho da turma e
tinha as melhores notas. Foi a minha primeira experiência de participação em
movimento organizado. Ali comecei, para nunca mais parar. Viva dona Sila.
Para secretária, indicou uma menina, de cujo nome não
me lembro. Só me lembro de que ela cantava e, convidada, cantou a música “Que
será”, grande sucesso na voz de Dalva de Oliveira. Ela cantou a música toda,
com muito desembaraço e segurança. Sempre que ouço a música, lembro-me daquele
momento.
Só fiquei no Grupo Escolar seis meses. No segundo semestre,
passei a estudar à noite, no Quarto Ano Primário, numa escola, também
municipal. Lá, eu era o mais novo da turma. Os outros eram todos adultos, com
mais de dezoito anos.
Os seis meses no Grupo Escolar,
deixaram marcas profundas em minha memória, principalmente, a iniciativa da
Dona Sila, com a criação do grêmio. A breve experiência no grêmio foi o pontapé
inicial da minha participação, até hoje, nos movimentos sociais.
Hoje, falta no processo educativo
atividades como aquelas, incentivadas por Dona Sila, que tinha a preocupação de
inserir as crianças no processo de construção da cidadania, necessário para a
construção da sociedade democrática, com participação de todos os cidadãos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário