O
DIRETOR, O DELEGADO E O JUIZ
Edmílson Martins
Janeiro de 2020
Eu
tinha 14 anos de idade e o meu primo Heron (de saudosa memória) 15 anos, em
1952.
Eu
e ele estudávamos na Escola Técnica da Associação dos Empregados no Comércio de
Crato, Ceará, à noite. Eu na quinta Série e ele no primeiro ano básico, hoje,
sexta série do Ensino Fundamental.
Certa noite, estávamos eu, meu primo e um amigo, chamado
Nílton, conversando na calçada da escola, quando chegou o Wílson, com quem o
Nílton tinha alguma desavença.
Os dois começaram a brigar. Eu e meu primo tentávamos
separar os dois para acabar com a briga. Mas enquanto segurávamos o Wílson, que
era mais forte, o Nílton pegou uma pedra e tacou na cabeça dele, causando um
pequeno ferimento. O sangue jorrou.
Dois funcionários da escola chegaram e nos seguraram.
Levaram-nos para a sala do diretor, que também era diretor de um banco local.
Homem sisudo, rigoroso, pavor dos alunos da escola. Era muito mais
administrador do que educador.
Eu e meu primo tentamos dizer que era apenas uma briguinha
de colegas e que nossa participação era uma tentativa separá-los. E que.
Infelizmente, um feriu o outro com uma pedra. Coisa que não pudemos evitar.
O diretor não aceitou nossas explicações e, em vez de
chamar nossos familiares por nós responsáveis, chamou o delegado. Era um
capitão da polícia. Um homem corpulento, de feições duras, ameaçador. Seu
aspecto duro não denotava compaixão. Metia medo na gente.
Como éramos menores, não nos podia prender. Colocou-nos num jipe e nos levou ao juiz local. Dirigiu-se a um hotel onde o juiz estaria em reunião. Lá esperamos até onze horas da noite, quando informaram que o juiz não estava naquela reunião.
Bem mal humorado, o delegado nos levou à residência do
juiz. Já era quase meia noite, quando ele acordou o doutor, que atendeu vestido
de pijama.
O delegado deu explicações. O juiz ouviu, circunspecto e
incomodado. E falou assim ao delegado:
-
O senhor, a essa hora da noite, me acorda para fazer queixa de quatro
adolescentes, por causa de uma briguinha entre eles!
Nós quatro, nesse momento, já estávamos solidários e, no
íntimo, batendo palmas para o juiz, contra o carrancudo delegado.
Então continuou o juiz:
-
Senhor delegado, esses probleminhas têm que ser resolvido com os pais desses
meninos, que a essa hora já deviam estar dormindo. Leve-os de volta para suas
casas.
E dirigindo-se a nós, disse, de forma paternal e
compreensiva:
-
Vão para casa e não briguem mais, tá?
O delegado, com cara de tacho, colocou-nos no jipe e nos
levou de volta à escola. E disse ao diretor:
-
O juiz é muito bonzinho, mandou trazer os meninos de volta e levá-los para
casa.
O diretor e secretária da escola, também com caras de
tacho, não sabiam o que dizer. Já tinham chamado o meu primo mais velho, com
quem morávamos, que nos levou para casa.
Ficaram pra lá o delegado truculento, o insensato
diretor, mais administrador do que educador, e a lembrança do simpático juiz
que ficou do nosso lado.
Quanto a mim, meu primo e os dois amigos, continuamos
nossa vida. No dia seguinte já conversávamos amigavelmente. E comentávamos a
truculência do diretor e do delegado e a benignidade do juiz que nos acolheu
com simpatia.
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