MINHA MÃE
Edmílson Martins
09 de
maio de 2021
Minha mãe. Joana
Maria. Conhecida por Nem. Dona Nem.
Partiu para a eternidade em 2003. Tinha noventa e oito anos de caminhada neste
planeta. Partiu, não morreu. Como disse Drummond: “Mãe não morre nunca. Mãe, na
sua graça, é eternidade”.
Minha mãe, sertaneja
forte, nascida e criada no sertão do Ceará. Teve dezenove filhos. Todos em
casa, com parteira, dona “Das dores”, madrasta do meu pai. Dos dezenove filhos,
só dois partiram ainda tenros. Rosa, com três anos e outro, que nasceu e logo a
seguir partiu.
Os dezessete que
ficaram cresceram sob os cuidados da dona Joana Maria, auxiliada por meu pai.
Ninguém morreu. Nove já partiram, quase todos acima de oitenta anos. Só um,
Luiz, partiu com menos de oitenta, mas acima de setenta e cinco anos.
Minha mãe, ao lado de
meu pai, muito agitado, era a serenidade em pessoa. Não se afobava. E acalmava
meu pai nos momentos de nervosismo. Quando ele se exacerbava, ela somente
dizia: “calma, homem”. E ele se acalmava.
Minha mãe,
super-religiosa, muito devota de São Francisco, sempre ia, em romaria, à cidade
de Canindé, santuário franciscano, celebrizado pela Música “Estrada de
Canindé”, cantada por Luiz Gonzaga: “Ai,
ai, que bom/Que bom, que bom que é/Uma estrada e a lua branca/ No sertão de
Canindé”. E quando podia, ela ia sempre à festa da padroeira, comemorações
do Natal e Semana Santa, na cidade mais próxima.
Todos os dias, após o
jantar, ela juntava a meninada e ensinava as principais orações: Pai Nosso, Ave
Maria, Ato de contrição, Salve Rainha, com a reza do terço. E ao final das
orações, contava histórias.
Ainda guardo na
memória uma das suas histórias. A do “pássaro azul”, ao qual uma menina
afeiçoara-se. Um dia o pássaro fugiu da gaiola, voando pra bem longe. A menina,
tristonha, sempre implorava: “Pássaro azul, Pássaro azul, volta”. Um dia, ele
voltou e se transformou em um rapaz muito bonito. Era um príncipe encantado.
Essa história e
outras encantavam todos. Autodidata, ela usava essa estratégia das histórias para
haver interesse pelas orações. Todos ficavam ansiosos para chegar o dia
seguinte, para rezar e ouvir as histórias.
Além dos cuidados da
casa, ela ainda encontrava tempo para costurar. Ainda me lembro dela, sentada
na sala, costurando roupas com sua máquina a manivela. Costurava para os filhos
e aceitava encomendas. Na sala, enquanto costurava, recebia as amigas para
conversar.
Tranquila,
compenetrada, atenciosa, sempre rejeitava as fofocas. Quando alguém tentava
contar alguma coisa que cheirava a fofoca, ela simplesmente falava: “deixa isso
pra lá, mulher”. E o assunto encerrava-se.
Ela adorava
participar das solenidades da Igreja. E manifestava sempre o desejo de morar em
lugar, onde próximo houvesse uma igreja. Meu pai era avesso às solenidades da
Igreja, mas sempre a acompanhava. E dizia, brincando: “vou falar com o padre
para você morar dentro da igreja”.
Hoje, ela está lá no
Céu, na Igreja, como sempre desejou, participando de todas as solenidades e
rezando para todos nós, que continuamos peregrinando aqui na terra, combatendo
o bom combate, até completarmos a corrida.