segunda-feira, 28 de julho de 2025

LEMBRANÇAS DA MINHA INFÂNCIA

 

 

 LEMBRANÇAS DA MINHA INFÂNCIA                                                                                                

 

                                  Edmílson Martins de Oliveira

                                   Julho/2025

 

Desejo narrar fatos ocorridos na minha primeira infância, quando eu tinha, mais ou menos, dois anos de idade, no sítio chamado Carnaúba, que ficava perto da cidade de Barro-Ceará. Revelo fatos dos primeiros anos de vida, até onde alcança minha memória. Lembranças que também são História e cultura.

 

Esclareço aqui que não é saudosismo, nem vontade de voltar pro passado. É saudade, sim, mas saudade terna. Lembranças de um passado alegre e feliz. Busca do que ficou de bom do passado. Como disse Coelho Neto, “Só há um meio de viver no passado e no futuro – é guardar recordações e sonhos”.

 

Ah se todos pudessem contar a sua história de vida! Muitos livros seriam editados. Viria à tona a sabedoria. A cultura e a História seriam mais fortes e verdadeiras. As pessoas cresceriam mais, ficariam mais autônomas e independentes. Os valores se revelariam, os relacionamentos ficariam mais fortes, haveria mais compreensão e o mundo ficaria mais solidário e feliz.

 

Logo depois do meu nascimento, os meus pais aceitaram administrar o sítio Carnaúba. Pra lá eu fui ainda em tenra idade. Nesse sítio ficamos durante uns quatro anos. Acho que até 1942. Em plena segunda guerra mundial, que eu desconhecia. Era propriedade do meu padrinho Juvêncio Barreto, membro de uma família de proprietários de terras. Lá, havia uma grande plantação de cana, para fabricação de rapadura.

 

Eu tinha mais ou menos dois anos e o meu irmão mais próximo, Emídio, tinha três anos e alguns meses. Sempre brincávamos juntos. E quantas peraltices  nós fazíamos! Eu e ele, que hoje está no Céu, sempre guardamos, com emoção, gratas recordações desse tempo de criança.

 

Todas as tardes, após um dia de brincadeiras e bem lambuzados, minhas irmãs Filó e Agnela nos banhavam numa bacia. Ainda me lembro da bacia: grande e redonda. Cabia nós dois. Quando a água estava sendo preparada, nós corríamos e nos escondíamos atrás das portas, pra não tomar banho. Mas só nos dias que Agnela nos dava banho. Ela era muito tolerante e generosa. Saía a nos procurar carinhosa. Nos dias da Filó, não nos escondíamos. Ela era durona.

 

Uma outra lembrança marcante: um carrinho puxado por um carneiro. Pertencia a um amigo de nome Mauro Mariano, que tinha uns cinco ou seis anos de idade. Eu e meu irmão tínhamos muita vontade de ter um carrinho como aquele. O Mauro mesmo fez o carrinho. Pra nos consolar, às vezes, ele deixava a gente passear no carrinho. Ele, generoso, ia puxando o carneiro.

 

Depois, eu e meu irmão tentávamos fazer um carrinho semelhante. E quantos outros brinquedos inventávamos! O ser humano foi criado para também ser criador. Ao criar o ser humano, Deus disse “Crescei e multiplicai-vos” (Gênesis 1,28). E todos nós crescemos, criando, construindo coisas belas, qualquer que seja a condição social. Sem criação, sem beleza, sem arte, a vida não existe.

 

Outro fato curioso do qual nunca esqueci. Um dia, depois do almoço, eu e alguns irmãos estávamos conversando, sentados em volta da mesa de refeições. Nas conversas, o meu irmão Emídio chamou o Luís de “fio da puta”. Eu, na minha inocência, pensei: isso é nome feio. Vou falar com o pai, que estava na sala deitado numa rede, enquanto minha mãe costurava. Quando falei, meu pai respondeu: chame ele aqui. Eu fui dar o recado, mas o Emídio já tinha fugido. Foi se esconder no canavial. Mais tarde, meu pai o encontrou e nem mais se lembrava do ocorrido. Cortou umas canas e, generoso, disse: leve para seus irmãos.

 

Ainda me lembro do engenho, situado do lado da casa em que morávamos. Existia, um grande terreno, chamado de bagaceira, onde eram colocados os bagaços das canas moídas. Ali, pastavam alguns animais: cavalos, burros, bois e vacas. Naquela área, nós, as crianças, muitas vezes, brincávamos entre os animais.

 

Entre os bois, pastava um boi velho, manso, chamado Ramalhete. Eu admirava muito aquele animal. Todos os dias, eu ficava na porteira que dava para a bagaceira e chamava-o pelo nome. Ele vinha ao meu encontro, passos lentos e faceiros e me pegava com os chifres e me rolava pelo chão, parecendo querer brincar. Eu gostava. Mas as pessoas grandes (ah essa gente grande!) vinham e acabavam com a brincadeira.

 

Foi nessa bagaceira que eu conheci pela primeira vez um veículo a motor. Era um caminhão que transportava a rapadura que meu pai vendia. Para mim, o caminhão era uma coisa fantástica: os faróis, os pneus, a carroceria, o motorista. Eu ficava deslumbrado. Nunca tinha visto aquilo.

 

A partir dali, fui tendo contato, ainda que precário, com as coisas do chamado progresso. Lembro-me de que, toda semana, na seca, como não tinha água perto de casa, minhas irmãs iam lavar roupas num lugar de nome “Olho d’água”, onde havia uma nascente. Lá moravam meus avôs maternos. Eu e meu irmão Emídio íamos com elas. Atravessávamos uma estrada de rodagem, por onde passavam automóveis, jipes, caminhões.  Eu observava tudo com muita curiosidade.

 

Todas as pessoas são criadas para aprender e crescer, nas observações, nas orientações, no contato com as coisas criadas. Daí, a necessidade do conhecimento. Ali, em tenra idade, eu, meu irmão e amigos desenvolvíamos nosso aprendizado na grande escola da vida.

 

Quando eu tinha quatro anos, meus pais encerraram a administração do sítio Carnaúba e voltamos todos para o sítio Ipueira. Lá fiquei até os dezesseis anos, quando comecei a trabalhar na cidade de Crato, depois de alguns anos de estudos escolares.

 

 

 

No sítio Ipueira, as lembranças são mais profundas e gratificantes. Lá vivi intensamente a infância e adolescência. Nessa fase de sonhos, fantasias e muitas e variadas experiências, aprendi muito. Com o tempo, acabaram-se as fantasias e ficaram os sonhos, que até hoje permanecem e nunca acabarão.

 

 

Na cidade de Crato, vivi intensamente minha adolescência e parte da juventude. Muitas emoções. Primeiros estudos com a inesquecível Dona Antônia, minha primeira professora, preparando-me para o Grupo Escolar Municipal. Onde estudavam ricos e pobres. Lá, estudei no Segundo Ano Primário e até me torneiro presidente do Grêmio Escolar da turma, por orientação da dona Sila, minha segunda professora.

 

 Depois, trabalho no comércio e no Banco de Crédito Comercial e estudos, à noite, na Escola Técnica de Comércio da Associação dos empregados no Comércio de Crato, onde me formei Técnico de Contabilidade. Bem, esse período da adolescência e juventude é assunto para um próximo texto.

 

 

 

 

 

 

sábado, 19 de julho de 2025

MEUS OITENTA E SETE ANOS

 

MEUS OITENTA E SETE ANOS

                                      Edmílson Martins de Oliveira

                                       17/07/2025

 

Hoje, completo 87 anos de vida neste planeta. Vim para a Terra em 1938, 11 dias antes da morte violenta de Lampião. Desembarquei no Sítio Ipueira, município de Barro, no sertão do Ceará. Região situada no polígono da seca, que abrange nove estados do semiárido nordestino.

 

Meus pais, sr. Antônio Bembém e sra. Joana Maria nasceram e se criaram no sertão. Agricultores quase a vida inteira. Nasceram agricultores e ficaram agricultores. E amavam a agricultura.

 

Eu nasci no sertão, na roça, e lá fiquei até os 16 anos de idade. Aos 12, fui para a escola na cidade de Crato, situada na região do Cariri, menos seca, por causa das fontes de água que jorram da Serra do Araripe. Sou um dos 17 irmãos, que, juntos aos meus pais, resistiram no seco sertão.

 

Nas férias escolares, até os 16 anos, voltava para o sítio Ipueira, para trabalhar nas roças. Eu, na verdade, não gostava dessa experiência de ficar na cidade e, nas férias escolares, ficar na roça, trabalhando. Na cidade, eu só estudava.

 

No sertão, aprendi muito com a gente simples com quem lá convivi. Aprendi a trabalhar, a pensar, a sonhar, a enfrentar os desafios da vida, a resistir diante das dificuldades. Aprendi muito na dureza, no trabalho penoso, na falta de condições normais de vida. Euclides da Cunha tinha razão: “O sertanejo é, antes de tudo, um forte”.

 

Trabalhei na roça, estudei em Crato, onde trabalhei no comércio, nas “Casas Pernambucanas”. Trabalhei também no Banco de Crédito Comercial. Adquiri novas experiências de trabalho. Conheci muitas pessoas na cidade, arrumei muitos amigos. E amigos inesquecíveis.

 

Em 1960, vim para o Rio de Janeiro. Por concurso, entrei no Banco de Crédito Real de Minas Gerais, depois no Banerj e depois no Banco do Brasil. Nessas instituições aprofundei experiências e arrumei muitos amigos.

 

A partir das orientações da Igreja Católica sobre a participação social, tornei-me sindicalista e até fui presidente do Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro. Lutei pelos direitos sociais, pelas liberdades sindicais e pelos direitos humanos. Participei de atividades políticas e até fui candidato a deputado estadual duas vezes.

 

Dentro do possível, continuo na luta pela construção da sociedade livre, justa e democrática. Como sugere Bertolt Brecht, poeta alemão, a luta tem que ser pela vida inteira. Diz ele: “Há homens que lutam um dia e são bons, há outros que lutam um ano e são melhores, há os que lutam muitos anos e são muito bons. Mas há os que lutam toda a vida e estes são imprescindíveis”.

 

 

 

 

sábado, 12 de julho de 2025

A CORRIDA

 

            

             A CORRIDA

                               Edmílson Martins de Oliveira

                               Julho/2025

 

Combatendo o bom combate

Eu vou fazendo a corrida

E correndo não abro mão

Da vida sempre aguerrida

Os caminhos são difíceis

Mas fazem parte da vida

 

Na corrida vou cantando

E louvando o Criador

Que nos deu todas as coisas

Com carinho e muito amor

Que nos fez inteligentes

E nos ama com fervor

 

Correndo posso cair

Também posso levantar

Pois guardando a fé no Altíssimo

Não posso desanimar

Vou seguindo e resoluto

Para ao destino chegar

 

Caminhando pelas trevas

Seguindo a Estrela brilhante

Vou sempre mostrando a Luz

A toda a gente passante

E nesse meu caminhar

Não sossego um só instante

 

De dia o brilho do sol

De noite o brilho da lua

Vencendo todo embaraço

A corrida continua

Vou seguindo pela vida

Cada um que siga a sua

 

Pode o demônio tentar

Que não vou ficar azedo

Pode o mundo revirar

Para mim não é segredo

O Jesus de Nazaré

Me disse pra não ter medo

 

Os velhos filhos das trevas

Ditam o que é vulgar

Com as suas armadilhas

Não irão me cooptar

Ao seu poder de domínio

Respondo chega pra lá

 

Tem tempo para acabar

O mundo da perdição

Só vai ficar para sempre

O mundo da construção

Tudo ficará na paz

Sem guerra ou destruição

 

Então a corrida termina

E guardaremos a fé

Podres poderes do mundo

Cairão no pontapé

Seremos fortes sem dúvida

Com Jesus de Nazaré

 

Pra corrida da vitória

Todos estão convidados

Para colocar nos trilhos

O mundo desembestado

Pra construir mundo novo

Destruindo o mundo errado