AS CHUVAS NO SERTÃO
Edmílson Martins de Oliveira
Junho/2025
Lembro-me ainda das chuvas no sertão, no meu tempo de criança. Pouco chovia, mas às vezes a chuva caía pesada. Rapidinho enchia os açudes. As águas corriam em pequenos riachos, onde as crianças brincavam de fazer pequenas represas.
Quando isso acontecia, era uma festa no sertão. O verde voltava, as plantas nasciam. As águas corriam pelo chão, tornando a terra fértil. Os animais alegravam-se, os pássaros cantavam mais alto. Enfim, toda a natureza ficava feliz.
Às vezes, a gente ia dormia, quando começava a chover. Durante a noite toda chovia. Chuva forte. A gente dormia, embalado pelo barulho da chuva no telhado e das goteiras, que derramavam as águas da chuva no chão. Era uma verdadeira sinfonia.
Cedinho, todo mundo despertava, com a cantarola dos sapos no açude. Cantavam alegres porque o açude estava cheio e eles podiam mergulhar e nadar. Conforme Jackson do Pandeiro, era assim que os sapos cantavam: - Tião/ - Oi!/ - Foste?/ - Fui!/ - Compraste?/ - Comprei!/ - Pagaste?/- Paguei!/ - Me diz quanto foi?/ - Foi quinhentos réis.
Com o cantarolar dos sapos, corríamos para o açude e o via cheinho. As águas saindo pelo sangradouro. Que alegria! Quanta água! Para celebrar a graça caída do Céu, cantávamos juntos com os sapos.
Toda a natureza se encantava: os homens iam para a roça, enxada ou foice ao ombro, assobiando ou cantando, aliados ao canto dos passarinhos e ao som do ronco dos riachos, cujas águas rolavam, espalhando-se pelo canavial.
As chuvas, graça de Deus, renovavam as esperanças dos sertanejos, que trabalhavam com mais vontade e vigor. Mulheres e homens, em funções específicas, trabalhavam com afinco nas plantações de milho, arroz e feijão.
Enquanto os adultos trabalhavam na roça, ou em casa, as crianças brincavam nos pequenos riachos e nas águas do açude, pescando pequenos peixes, que surgiam com as enchentes.
As chuvas eram o resultado das permanentes preces dirigidas a Deus e aos santos, principalmente, ao senhor São José. Dezenove de março era o dia esperado para a chuva cair. Se chovesse no dia de São José, estaria garantida a safra. A partir desse dia a chuva continuaria.
Eu e outras crianças também fazíamos nossas preces quando gritávamos pelas estradas: “manda Deus chuva pra nós comer arroz”. Feijão e milho eram mais comuns. Arroz era mais escasso, porque dependia de muita chuva.
Tempo bom aquele! Tempo de bonança. Alegria sem igual. Chovendo, o sertanejo deliciava-se, plantando, cultivando e colhendo o produto do seu trabalho. Felicidade geral. A tristeza ia-se embora. O povo e toda a natureza encantavam-se com as chuvas.
Daí, aquele trecho da música “A Volta da Asa Branca”, de Luiz Gonzaga e Zé Dantas: “Rios correndo, as cachoeiras tão zoando/Terra molhada, mato verde, que riqueza/E a asa branca, tarde canta, que beleza/Ai, ai, o povo alegre, mais alegre a natureza”.
E as crianças, envolvidas nesse clima saudável, viviam felizes, sem traumas, ou depressão, como nas grandes cidades. Sem ansiedade e livres dos sistemas que hoje escravizam, impondo o consumo do que não é necessário, cresciam saudáveis, criativas e autônomas.
Essas lembranças me tocam profundamente e me ajudam a pensar na necessidade dos cuidados que todos devem ter com a natureza, hoje tão violentada, por causa da ganância dos lucros e da sede de poder.
Só com a natureza, o meio ambiente, o planeta, nossa casa comum, bem cuidados e cultivados, poderemos viver em paz e felizes. Isso só será possível, quando vivermos em Harmonia conosco mesmo, com os outros, com a natureza e com o Criador.