RECADO ÀS NOVAS GERAÇÕES
Edmílson Martins
Junho de 2020
O ano de 1960 iniciava
uma década de efervescência social e política. Eu e outros jovens pertencíamos
a uma geração que queria mudar o mundo. Participando de movimentos da Igreja
Católica, éramos animados pelas propostas do Concílio Ecumênico Vaticano II,
convocado pelo papa João XXIII. Ele convidava todas as pessoas de boa vontade e
todos os povos para a “imensa tarefa de restaurar as relações de convivência
humana na base da verdade, justiça, amor e liberdade”.
Mostrava a necessidade de
se construir a paz e a coexistência pacífica e civilizada entre todos os seres
humanos. Promovendo o rejuvenescimento da face de Cristo, evocava a força
transformadora do Evangelho e lembrava aos cristãos a missão de construir o
Reino de Deus na terra, agindo no mundo conforme a proposta libertadora de
Jesus Cristo, sempre repleto de eterna juventude. Deveríamos ser fermento na
massa.
Cresceu a participação da
juventude, quando sentiu que poderia ser agente das mudanças, das conquistas
sociais e da construção da sociedade. Com a sua sensibilidade, energia e
disposição, os jovens partiram para a ação, mostrando que tinham capacidade e
visão de mundo, podendo apontar rumos de mudanças. Não nos conformávamos com o
mundo do jeito que estava. Tinha que mudar.
Inicialmente, no nosso
grupo, éramos poucos jovens. Na Congregação Mariana da igreja do Imaculado Coração
de Maria, no Méier, participávamos de profundas reflexões, nas manhãs de
domingo, à luz do Evangelho e do Concílio, sobre o papel dos cristãos no mundo:
ser testemunhas de Cristo na sociedade, agentes de construção da justiça e da
paz. Assim mostravam os Evangelhos e os documentos sociais da Igreja.
Éramos poucos e queríamos
ser multiplicados, na convicção de que “grande é a messe e poucos os
operários”. E fomos à praça em busca de mais operários. E então vários outros
jovens, sedentos de participação, surgiram. E aprofundamos as ideias de
mudanças, mudanças pessoais, com perspectiva de mudanças sociais.
Naquele momento, existia
no mundo um fervor na política: a Revolução Cubana; a resistência dos
vietnamitas contra a dominação do império norte americano; as guerras no
Oriente Médio; a explosão do Movimento Negro nos Estados Unidos, liderado pelo
pastor Martin Luther King; as ditaduras militares na América Latina, etc. Tudo
isso fazia crescer na juventude a consciência de que o mundo precisava mudar. Assim,
o sonho de liberdade e a esperança aumentava.
As duas primeiras
encíclicas sociais, Mater et Magister e Pacem in Terris, do papa João XXIII, animavam muito os jovens do
mundo inteiro, independente do credo religioso,
a se integrarem no sonho da construção do mundo justo, fraterno e
solidário.
A Encíclica Populorum
Progressio, do papa Paulo VI, sempre atual, defendendo o desenvolvimento integral
do homem, da solidariedade universal; a renovação da ordem temporal; pregando a mudança da mentalidade, dos costumes, das
leis e das estruturas sociais e políticas convidava os cristãos e todas as
pessoas de boa vontade a lutar por uma civilização solidária.
Alguns de nós se formaram
engenheiros, professores, médicos,
advogados, e outros exerceram profissões
diversas, levando, cada um, para sua profissão e para sua comunidade de vida,
esse espírito evangélico de construtor do Reino de Deus, sempre pugnando por
uma sociedade mais justa e fraterna.
Alguns ingressaram nas
atividades sindicais, políticas e partidárias, movimentos populares, etc. Todos
se destacaram em suas profissões e atividades sociais. E alguns se destacaram
na atuação política e partidária, em cargos parlamentares.
Hoje, sexagenários, septuagenários,
e alguns, até octogenários, não nos conformamos com o mundo do jeito que está,
mas guardamos a convicção de que, como o semeador do Evangelho, semeamos a
semente e, talvez, parte tenha caído à beira do caminho, outra em terreno
pedregoso, outra entre os espinhos, mas sabemos que boa parte caiu em terreno
fértil. A colheita? Deixemos a Quem de direito. Fizemos a nossa parte.
Concluindo: queríamos
realmente mudar o mundo. Alimentamos esse sonho e investimos nesse projeto,
mantendo sempre a certeza de que esse investimento não tinha um sentido passageiro
ou imediato. Acreditávamos ser um processo de construção de tempo indefinido,
permanente e eterno.
Para nós, não existia,
nem existe a questão do tempo, mas os valores eternos, ontem, hoje e
sempre. Por isso, insistimos na
convicção de que o sonho de mudança continuará, porque mudar é sempre um desejo
e necessidade do ser humano. Como disse d. Hélder Câmara – eterno jovem e
portador de eterna esperança- ”Quem não precisa de conversão?”
Também hoje, os jovens
não devem se conformar com o mundo do jeito que ele está. Precisam sonhar,
alimentar a utopia de que um mundo melhor é possível e lutar com entusiasmo e
esperança, sem pressa, sem a ânsia de resultados imediatos. É preciso pensar e
sonhar grande. Só luta com ardor quem pensa em coisas grandes e tem sonhos
belos.