17 DE ABRIL, HÁ 48
ANOS
Edmílson Martins
Abril de 2020
Era uma
segunda-feira. Acordei cedo, após um fim de semana com a família: Maria José,
Maurício, com quatro anos e Rinaldo, que, no mês seguinte, faria dois anos.
Arrumei o material de trabalho, despedi-me deles e
parti para o Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro. Eu estava presidente.
Eleito pela categoria, numa eleição democrática, apesar dos limites impostos
pela ditadura que dominava o Brasil.
Corria o ano de 1972 e o Brasil tinha como presidente,
imposto pelo regime militar, o general Emílio Garrastazu Médici, o mais
truculento de todo o período ditatorial.
O país vivia um clima nebuloso e de incertezas, com
perseguições, prisões e desaparecimentos de lideranças populares.
Sindicalistas, por exemplo, saíam de casa para o sindicato e não sabiam se
voltariam.
Aquele dia foi de muita atividade. Os bancos não
cumpriam as decisões da Justiça do Trabalho, nem cumpriam os acordos sindicais,
com a cobertura do todo poderoso ministro da Fazenda Delfim Neto. A diretoria,
então, se empenhava no sentido de mobilizar a categoria para cobrar dos
banqueiros o cumprimento das decisões judiciais e dos acordos sindicais.
Embora a diretoria percebesse que o clima político era
tenso e que, a qualquer momento, poderia haver uma ação violenta por parte da ditadura,
não se intimidava e prosseguia no trabalho de mobilização da categoria.
A diretoria não sabia que tudo estava sendo tramado,
pelo regime, para reprimir o sagrado direito dos trabalhadores, de lutar pelas
suas reivindicações. Tudo tramado. Tudo decidido no escuro, nos bastidores do
regime que deixou o país na escuridão, durante vinte e um anos.
Eu estudava à noite, na Universidade Gama Filho, no
curso de Letras (Português/Literatura) e naquele dia tinha que fazer uma prova,
às 20h30m. Era uma prova de Língua Portuguesa.
Às 19h30m, quando me preparava para sair do sindicato,
ouvi um reboliço. De repente, surgiu o delegado regional do trabalho, Luiz
Carlos de Brito, de triste memória, à frente de vários agentes da Polícia
Federal, fortemente armados.
- Onde está o presidente – indagou o delegado.
Eu me apresentei e perguntei o que estava havendo. Ele
respondeu, de forma arrogante: - De ordem do senhor ministro do trabalho, este
sindicato está sob intervenção.
- Qual o motivo da intervenção, senhor delegado? –
perguntei. E ele respondeu: - vocês estão fazendo comunismo. Eu prontamente
retruquei: - Não senhor, estamos fazendo sindicalismo.
Nada esclareceu e não aceitou explicações. Resultado:
Não voltei para casa. Fiquei preso, junto com mais três companheiros, durante
quarenta e seis dias.
É claro que nada de errado ficou provado. O processo
armado pelo delegado e a Polícia Federal foi arquivado pela Segunda Auditoria da
Marinha, que tinha como titular um juiz digno: Dr. Paulo Simões Correa.
Mas, esse dia fatídico, 17 de abril de 1972, nunca
sairá da minha memória. Aquele fato foi perverso, marcando muito a minha
existência, a da Maria José, dos filhos nascidos, das filhas que nasceram
depois, de toda a família e de muitos amigos.